“Chamar o Raul”

(Catedral de Havana. Ao redor, fizeram um Mercado)

Catedral de Havana. Ao seu redor, fizeram um mercado.

Existem expressões que se consagram e, de bom ou mau gosto, entram para o dicionário informal, fincam pé e nunca mais saem de lá.

“Chamar o Raul” é uma delas, e para os que não a conhecem (e não tem o menor problema isso, porque ninguém tem obrigação de conhecer expressões de mau gosto, em não sendo escritor).

Assim, vou logo explicando que significa, segundo o dicionário:

“Lançar para fora, com esforço, algo que o estômago não conseguiu digerir”. No popular, é vomitar, mesmo.

O vocábulo me veio à reminiscência (ih, pra que fui falar em dicionário, me veio logo a vontade de falar difícil, droga) quando li a matéria da visita do irmão-herdeiro Castro ao Papa.

Sem dúvida, Francisco teve papel mais que importante na aproximação Cuba/ EUA. Por outro lado, me parece claro que a situação já estava num ponto de maturidade para que isso acontecesse, só que nenhum governante teve inteligência suficiente para sacar que os dois lados já estavam precisando de que alguma alma caridosa interviesse para que aceitassem imediatamente a paz, sem colocar muitas dificuldades. Dona Dilma perdeu uma grande oportunidade de fazer um “social”, e o Sr. Luiz Inácio também — sendo tão amigos dos rauls da vida e tão “importantes” no cenário mundial…

Imagino que nas negociações os dois países jogaram para a plateia, e o Vaticano deve ter ficado com a incumbência de enviar pequenos e grandes recados, aqueles de praxe, tipo “respeitar minha independência”, “não meter o nariz nos assuntos internos”, enfim…

Enfim mesmo. Francisco mais uma vez mostrou a que veio e fez mais um gol, ainda bem que não foi da seleção argentina. Conseguiu a reaproximação e parece que o retorno de alguma relação comercial; os cubanos de Miami poderão visitar a ilha e turistas americanos também.

Tudo anda bem quando termina bem. Agora, para as almas que se lascaram no paredón a história não acabou nada bem, mas para os muitos católicos que por medo escondiam suas manifestações de fé, eu disse MEDO, tomara que acabe de outro jeito. Afinal, o mundo é outro, a internet conta as histórias em tempo real e fica mais difícil esconder perseguições.

Eu saboreava a leitura da matéria, vibrando pela inteligência de Francisco — em que pesem algumas sérias restrições que faço à sua Igreja —, louvando a sua vitória, quando li uma frase que me deixou de estômago embrulhado face à cretinice demagógica, num nível que nos faz parecer um bando de idiotas que poderiam acreditar numa balela desse porte.

O cara de pau da ilha declarou que o Papa tem sabedoria e modéstia, que lê todos os seus discursos e que, se o Papa continuar assim, PASMEM senhores, ele, Raúl Castro, voltará a frequentar a Igreja Católica.

Ora, faça-me o favor, irmão-herdeiro, eu estive em Cuba há 23 anos, fiquei revoltada com o que o mundo fez com a ilha, o bloqueio penalizando toda uma população. Mas também fiquei horrorizada com a onipotência do Sr. Fidel, que resolveu se aliar apenas à Rússia, para mostrar ao mundo que os comunistas se protegem, são amigos, solidários, etc. e tal, e o que vi foi que Cuba aprendeu com a Rússia apenas a montar bicicletas e televisores, e que a tecnologia mais importante que foi repassada foi a Biotecnologia, acredito eu que por causa de Chernobyl, lembram?

Pois mesmo antes de a cortina de ferro enferrujar, Cuba já estava a ver navios.

Olhem, queridos leitores, lendo e lembrando do que vi em Cuba, e talvez porque hoje seja o 13 de maio, dia da Libertação, quase liberei minha revolta por essa atitude demagógica e por outras tantas que vivemos hoje aqui no Brasil. Quase “chamei o Raul”…

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