Uma geração de ETs

daisy4maiOntem, vi num jornal da TV que uma das intenções do candidato à presidência nos Estados Unidos, Donald Trump, é acabar com o Departamento de Educação (lá ministérios são departamentos). Ao mesmo tempo, por aqui, as autoridades da Educação pedem “sugestões” para alteração dos currículos escolares.

Não consigo deixar de fazer considerações sobre os dois fatos.

Primeiro: certamente, ao afirmar que vai acabar com o Departamento de Educação, algum plano mais elaborado e abrangente vai substituir o atual.  Ora, o americano não é bobo, né? Com tantas universidades importantes, MIT, Columbia, com a pesquisa de ponta que fazem institutos importantes mundialmente conhecidos e respeitados, não aceitariam jogar isso tudo no lixo, logo o americano, que se orgulha tanto quanto fala “America”, se apropriando do nome do continente como se fosse todo seu.

Aqui, numa atitude eleitoreira, que nos demonstra uma das razões pelas quais o PT não vai pra frente, pedem sugestões ao povo num assunto estritamente técnico. Engodo!  Deveriam, sim, espalhar equipes de técnicos em Educação, pesquisando neste patchwork de culturas e hábitos que é o nosso país. Claro que deveria haver diversidade em alguns temas nas disciplinas, para atender às inúmeras crenças e subculturas destes nossos Brasis. Temas que seriam tratados com naturalidade e simplicidade no Chuí, não seriam recebidos pela cultura de Marajó, por exemplo.

Mas, prestem atenção, eu me refiro a TEMAS, não a disciplinas. Estas deveriam como sempre, ter um núcleo comum, sem deixar de atender às variações regionais. Definidas a princípio por TÉCNICOS da Educação, ouvidas as necessidades regionais e depois, em Seminários nacionais, sendo debatidos e condensados por eles, aí sim, com representantes de pais, de alunos, de associações.

O governo do PT, no entanto, prefere ficar discutindo, discutindo, para, como já vimos acontecer em outras situações, não resolver NADA. Aí, entra um tecnocrata de plantão, cuja melhor recomendação para o cargo é ser dos quadros do PT — haja vista que o ministro Mercadante, da Educação, é economista, desconheço que tenha formação em Educação, recebeu o ministério como presente à sua lealdade ao governo.

E a nossa Educação continua indo pro brejo. Um assunto tão importante como este, fica à mercê de opiniões populares. Enquanto isso, a educação das escolas públicas oficiais vai sendo destruída e segue aos trambolhões.

Houve um tempo que as escolas preparavam para o êxito. Hoje, quem quiser deixar seu filho minimamente preparado para o futuro, deve PAGAR. No passado, havia um dito popular sobre escolas particulares — do qual eu, inclusive, discordava, devido à generalização, apesar de sempre ter estudado em escolas públicas. O dito era assim: “Papai pagou, passou!”

Hoje, as escolas públicas vivem em paralisação, professores recebendo salários desmoralizantes que não lhes permitem nenhuma hipótese de investimento em seu aprimoramento. Os alunos estão cada vez mais agressivos e são inacreditáveis as queixas dos professores sobre os inúmeros tipos de agressões verbais e até físicas que sofrem em algumas comunidades, e aqui não me refiro a favelas, mas a regiões do país.

Eu pergunto: que tipo de incentivo e exemplo de respeitabilidade o governo oferece a esses alunos, para que vejam seus professores como algo além do que muitos deles ouviram… “Eu te pago para você me ensinar, tá…”? O próprio sistema educacional desrespeita os professores, ao remunerá-los dessa forma absurda. Muitos deles abandonam sua vocação e vão trabalhar em lojas ou exercer outras atividades.

O assunto hoje é o impeachment, que está no fórum adequado: o Senado Federal vai se manifestar. Não esperemos, no entanto, que o próximo governo seja milagreiro: não vai conseguir, sabemos nós, colocar a Economia nos eixos; não vai fazer, a curto prazo, com que o Brasil saia da zona de risco em que a incompetência, a ambição desmedida, a corrupção e o aparelhamento do Estado o colocou; tampouco vai produzir emprego para 10 milhões de desempregados de uma hora para outra. Os tempos são tenebrosos, ainda vamos passar por muitas dificuldades.

Por outro lado, espero que o casuísmo e a militância não representem, no próximo governo, um salvo-conduto para a escolha de ministros, pelo menos de áreas tão sensíveis e importantes como a Educação. Que os técnicos façam seu trabalho e os leigos escutem, discutam com eles, e os respeitem. Que o governo e a sociedade respeitem os profissionais da Educação, para que todos — alunos, pais, povo brasileiro — os respeitem e valorizem.

Que a Educação volte a ser tratada como um assunto técnico, que merece estudos sérios e profundos, e que a diversidade seja uma tônica para atender necessidades regionais. Que a universidade seja mais do que um monte de livros e conceitos, que faça parcerias profícuas com o mundo empresarial.

Que as crianças e adolescentes possam ver sentido no que estudam, possam aplicar seus conhecimentos à vida. Ou veremos uma geração de ETs, que não conseguem aplicar conceitos e preferem os joguinhos e o Google, que para eles fazem mais sentido do que as abstrações que a escola lhe empurra goela abaixo.

O governo chama o povo para dar palpite em assunto de especialistas, confirmando o desrespeito aos especialistas em Educação. Por que o governo não pede a opinião do povo na economia?

Lá, o Trump anuncia que vai acabar com o departamento para ampliar e renovar. Aqui, não precisa anunciar:  o título “Ministério” permanece, mas a Educação já acabou.

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