Generosidade

daisyjun29Há muitos anos (às vezes me parece até que tive outra vida nesta mesma vida), morei no interior. Criei meus filhos com muita luz e muito espaço, sua infância foi viva, repleta de experiências que jamais teriam se tivéssemos vivido em apartamento. Viram animais se reproduzindo, plantas crescendo, cultivaram horta, subiram em árvores. Eu, ainda estudando, fui buscar novos interesses. Criei animais, plantei, colhi, fiz de tudo um pouco.

Voltei para o Rio de Janeiro, minha vida deu muitas voltas, passei novamente a morar em apartamento, o que demandou uma boa dose de vontade para readaptação. Entretanto, a “camponesa” nunca me abandonou e continuei a cultivar minhas flores e mini-hortas nas minhas varandas.

Numa manhã do mês passado, percebi um pássaro que, insistente, corria de um lado a outro na varanda do meu quarto, onde tenho uma planta dessas que chamam de trepadeira, com flores.

Na semana passada, no meio das flores, me apareceu um tomateiro. Lindo, carregadinho de pequenos frutos amarelos.

Talvez alguém que tenha pensamento mais cartesiano pudesse imaginar “que coincidência”, mas eu, que cometo minhas poesias, logo entendi o corre-corre do pássaro: ele me presenteou com sementes de tomates…

O tipo de tomate? Fui pesquisar…O nome é Yellow Perfection, olhem só que interessante… Realmente, a natureza é perfeita.

E passei a refletir como a natureza é generosa, como compartilha, com que sabedoria sai espalhando sementes e frutos.

E tenho, então, que estabelecer a comparação entre o comportamento humano e o da Mãe Natureza. Enquanto ela concede, os homens subtraem. Compartilhar? Hoje em dia, principalmente fotos glamourosas, de momentos que muitas vezes nem foram tão felizes assim, mas que servem para espalhar nas redes sociais falsas caras e bocas de felicidade.

Mas, na hora da solidariedade, o que se vê? Imigrantes arriscando suas vidas e de seus filhos, porque é a única forma possível de salvação contra a miséria e a tirania; países trancando suas fronteiras para essa gente desesperada que sai numa diáspora insana, andando quilômetros com crianças, velhos, doentes, em busca de um pouso qualquer; políticos corruptos, que nem por um minuto parecem se incomodar com as filas nos hospitais, com os que morrem por falta de atendimento, com os que vendem o almoço para pagar o jantar, ou com os que nem isso podem fazer. E me pergunto: Será tão difícil perceber a generosidade que existe em cada amanhecer, com a oportunidade de revermos nossas atitudes, melhorarmos como seres humanos?

Não sou partidária do conceito de que mudando nossa postura mudaremos a postura do outro, não é isso. O outro muda quando quer e quando pode, mas o que acontece é que nós ficamos melhores, porque aprendemos a lidar com a realidade do outro, simples assim.

E, num momento de tanta discussão, de tanta insegurança, nada melhor do que nos voltarmos a observar a natureza e dela extrair ensinamentos. É o que faço agora, agradecendo ao pássaro que me proporcionou esse momento de muita alegria.

 

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