Papo de boteco: fidelidade

No BotecoUma das características mais marcantes e agradáveis do Rio de Janeiro é, naquele finzinho de tarde de domingo, a reunião de amigos no boteco, seja lá o que se queira entender por boteco.  Normalmente o objetivo nesta nossa turma é, como dizem todos, exorcizar a semana que foi e brindar a que está chegando.

— Em BSB não tinha isso.

— BSB? É nova marca de papel higiênico? — Cristina não perdoa.

— Que marca? Ora, você sabe muito bem o que é BSB, não conhece a capital do seu país?

Riso geral, a galera querendo sangue!

Os papos de domingo na tchurma geralmente são movidos a muita emoção, acho que para embalar as frustrações da semana finda, ou para energizar a nova.

A raiva, senhores, energiza. Ora, hoje, no Brasil, nada melhor para suscitar raiva do que falar de Brasília. Imediatamente nos lembramos dos lava-jatos da vida, um jato tão forte que chegou até a Suíça.

— Ela conhece, e como… Você esqueceu que ela foi mulher do chefe de gabinete do…

— Por favor, esquece o falecido, melhor citar meus outros três maridos posteriores, pelo menos não eram políticos.

— Três? Eu só conheci dois.

— Ah, os outros foram ensaios, casamento de verdade é o nosso agora, não é, Cristina? — diz o marido.

— Claro, querido. O melhor de todos.

— Taí, bom assunto para nós: o que seria o “casamento melhor de todos”.

— Ih, eu não sou opinião de peso no assunto, só casei uma vez, não posso comparar.

— E eu, que não casei?

— Não sabe o que perdeu…

— Pois você não sabe é o que eu achei, não casando…

— Poderia ter achado o quê?

— Paz, independência, segurança, autoestima…

Aí a discussão se acalorou. Os quatro homens e as três mulheres não se entendiam mesmo, os homens diziam que o casamento promovia exatamente isso, paz, independência, segurança e autoestima.

— Querem ver? Olhem para ela — Gerson colocou a mão no ombro de sua mulher, sentada ao seu lado.

— Tá, olhamos. E é para ver o quê?

— Ela é a cara da paz — respondeu Gerson.

Outra vez muito riso, todas as vozes ouvidas ao mesmo tempo, até que alguém se lembrou de pedir a opinião da própria. Fez-se o silêncio, e Nina começou a falar, naquela sua voz de conselheira tutelar, pausadamente.

— Sim, pode ser verdade. O amor…

— O amor? Ah, quantos aninhos de casamento? Ah, um… um aninho… O segundo de vocês dois, não é?

Nina se esticou na cadeira. Ia responder quando Cláudio, solteirão convicto e amigo antigo, assegurou que ela, antes de casar, já era “aquilo tudo”…

A expressão não pegou muito bem, mas o clima não azedou. As pessoas desta tchurma são descoladas, não vão se perturbar com coisa insignificante assim, pensei.

Mas o assunto, por obra sabe-se lá de quem, migrou para a fidelidade.

E veio a pérola que o marido da Nina jogou em seu pescoço, com olhar melífluo, aquele mesmo que se lança quando se quer dizer “eu sou mais eu”.

— Fidelidade? Para mim, só a companhia aérea… — pausa — por causa das milhagens, vocês sabem …

Vá saber!

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